Mesmo de longe, Gabriel Sara não esquece seu time de coração
Prestes a completar um ano na Inglaterra, Gabriel Sara sabe muito bem o significado de altos e baixos. O meia sofreu bastante em seu início na Europa, mas terminou a temporada como melhor jogador do Norwich, em votação feita com os próprios torcedores do clube.
Contratado junto ao São Paulo em julho de 2022 por R$ 56,7 milhões, ele chegou ao futebol inglês na fase final de recuperação da grave lesão que teve no tornozelo direito. Algo que o fez sofrer muito, conforme ele contou em entrevista exclusiva à ESPN.
“Foi terrível no começo. Foi bem difícil. Até por conta da língua. E também porque estava todo mundo em um ritmo diferente. O pessoal estava em pré-temporada, todo mundo voando e eu ainda voltando de cirurgia. Eu até brinco com meu pai que estava todo mundo muito rápido e eu muito devagar. E aí, conforme eu fui pegando o ritmo de volta, retomando a confiança, me sentindo melhor, as coisas começaram a fluir”, iniciou ele, que considera a sua primeira temporada “um misto de alegria com um pouco de frustração”.
Além da dificuldade causada pela lesão, Sara ainda teve que se adaptar a um jogo bem diferente. Se no Brasil ele atuava em um time grande, na Inglaterra ele chegou para disputar a segunda divisão.
“Não é simples você trocar o seu país por uma nova língua, cultura. Um estilo de jogo diferente. A Championship é muito física. Tem jogadores que são extremamente fortes e intensos. É um tipo de jogo diferente. Para eu me adequar ao estilo de jogo foi bem complicado. Digamos que eu dei sorte. O meu time é um time que gosta de jogar um pouco mais. O nosso treinador pede isso, que a gente jogue com coragem, desfrute do jogo, que a gente possa dar um bom espetáculo para o torcedor. Isso me ajudou um pouco, é claro, mas querendo ou não, em determinados jogos é muito difícil, porque tem times que não querem jogar, só querem conseguir um gol e impor a força física”.
O jogo diferente o fez até mesmo trocar de posição. Na Inglaterra, o jogador, que nos tempos de São Paulo atuava mais como um meia-armador, foi recuado, jogando como segundo volante. Apesar de ter ficado mais longe do gol, Sara acredita que a mudança foi benéfica:
“Eu acho que foi bom para mim. Mesmo que eu tenha feito alguns gols essa temporada, eu me afasto um pouco do gol, só que eu pego muito mais na bola. Eu acho que participo muito mais do jogo e isso é o que eu tenho desfrutado nessa nova posição. É claro, eu tenho mais responsabilidade defensiva, que é algo que ainda estou aprendendo, mas no geral eu consigo participar mais do jogo, tocar mais na bola, criar mais chances de gol. Eu acho que isso foi um ótimo acréscimo para mim”.
Se hoje ele se sente à vontade tanto dentro de campo, quanto fora, o início da adaptação foi bem complicado. Como se não bastassem as dificuldades físicas, ele também teve dificuldades em conseguir se comunicar com as pessoas.
“Norwich é uma cidade bem pequena. Tem poucos brasileiros. A gente encontrou alguns e fez algumas amizades, mas é bem difícil. Eu vim com a minha namorada, então querendo ou não era eu e ela. Eu tinha o tradutor que o clube contratou, que é para mim e para o chileno, que também falava português, então foi mais uma amizade que eu fiz. O Marcelino, que veio da Universidad Católica também, fala espanhol, não é a mesma coisa, mas deu uma ajuda. Isso também acaba ajudando na adaptação. Você acaba se sentindo mais afastado. Por causa da língua, você não consegue falar com as pessoas, acaba sendo uma situação um pouco chata dentro do clube”.
Tudo melhorou para Sara com a contratação de um velho conhecido dos tempos de categorias de base do São Paulo: “Aí depois da chegada do Marquinhos, me ajudou bastante. Foi no meio da temporada, eu já estava um pouco mais adaptado. É uma cidade pequena, mas é uma boa cidade, é bem calma, mas para a gente que estava acostumado a morar em São Paulo, cheio de amigos ao redor, foi um pouco complicado. Eu conheço o Marquinhos há anos. Quando ele falou que estava vindo para cá, eu fiquei feliz da vida. Agora não sou mais o único brasileiro, tenho alguém para conversar, alguém para dividir as coisas”.
Apesar de estar atuando em um time da segunda divisão, Gabriel Sara tem muito claros os seus objetivos dentro do futebol.
“Eu sempre brigo pelos meus sonhos. E por isso que eu aceitei vim para o Norwich. Eu queria jogar a Premier League. Essa é a minha meta para a próxima temporada. O que foi frustração nessa temporada, eu espero que na próxima possa ser alegria da gente conseguindo essa promoção e eu realizando meu sonho de jogar a Premier League”.
Feliz na Inglaterra, Sara é daquele tipo de pessoa que não consegue esquecer as origens. E mesmo estando a cerca de 10 mil km de distância, ele segue acompanhando o São Paulo, clube em que chegou em 2013, na base, e deixou depois de nove anos.
“Eu ainda falo com os meus amigos lá dentro. Com o Nestor e o pessoal e eu assisto a todos os jogos que são às 16h e aqueles das 18h30 eu consigo assistir também. Eu até assisti contra o Internacional, que a gente ganhou de 2 a 0. Eu tento acompanhar sempre que dá. Quando os jogos são muito tarde, infelizmente não dá, mas eu sou mais um torcedor do São Paulo, então sempre que dá, eu acompanho”.
Além de torcedor, o jogador se mostra muito grato a tudo o que viveu dentro do clube. E até planeja um retorno no futuro.
“Eu passei mais tempo no São Paulo do que na minha casa, com os meus pais. Então eu sei o que é o sentimento do torcedor. O São Paulo para mim é especial. É claro que hoje eu não estaria aqui sem o São Paulo. Tenho uma gratidão enorme com o São Paulo. Ainda tenho objetivos que eu não concluí no São Paulo. Sonhos que eu ainda quero concluir. Sempre que o São Paulo está bem, eu fico feliz e quando o São Paulo está mal, eu fico torcendo para que melhore. Para que o São Paulo alcance os tempos de glórias novamente”.
Nos tempos de Tricolor, o meia foi treinado por alguns meses por Rogério Ceni, que foi demitido pelo clube recentemente. Apesar disso, ele acredita que a história do ex-goleiro sempre estará misturada com a do clube.
“O Rogério é um cara que ama o clube. Quando você pensa em São Paulo, você lembra de Rogério. É bem complicado, mas a gente sabe como é que funciona o futebol. Um ciclo se encerra, outro se inicia e a gente tem que seguir. Acho que se tudo for feito pelo bem do clube, essas coisas acontecem. Mas eu não conheci na minha vida alguém mais são-paulino que o Rogério, sinceramente”.
Fonte: ESPN